A primeira cena de Coração Louco (Crazy Heart, 2009) é icônica e resume bem a vida que leva o protagonista da trama. Embalado em música country, um carro percorre uma grande distância. Quando chega ao seu destino, um boliche decadente no meio do nada, sai dali a estrela da noite: Bad Blake (Jeff Bridges), com seu chapéu surrado, o cinto desafivelado, calça jeans aberta, camisa rasgada no cotovelo e um galão cheio de um certo líquido amarelo que ele despeja ao lado de sua picape vermelha enquanto amaldiçoa o seu empresário.
Blake, que já foi mais famoso, ainda consegue atrair um certo público aos shows que faz nessas cidades minúsculas do sul dos Estados Unidos. A audiência desses pequenos bares onde toca acompanhado de uma banda local é composta basicamente por pessoas da sua faixa etária, tão ou mais embriagadas que ele, mas felizes de ter uma estrela da música ali na sua frente. O único que parece indgnado de estar ali é Blake, que se reconhece como uma estrela já quase sem luz própria e busca algum consolo no fundo de uma garrafa.
Não que isso o impeça de ainda tirar proveito do que restou da sua fama e raramente dormir sozinho nos moteis baratos onde se hospeda. Em um desses poucos momentos em que é tratado como estrela da música, ele é requisitado para uma entrevista. Quando Jean (Maggie Gyllenhaal), a repórter do jornal local de Santa Fé, entra em seu quarto, ele se apaixona pelo seu jeito meigo e seus briilhantes olhos azuis. E ela também se encanta com o charme do velho artista, que durante a entrevista continua jantando e acendendo um cigarro no outro com a maior naturalidade, mas encerra a entrevista quando sua vida pessoal surge na pauta. Ele não comenta sobre sua antiga parceria com o atual "queridinho" do country, Tommy Sweet (Colin Farrell), nem fala de sua família.
Jean, que cuida sozinha de seu filho, sabe dos riscos de uma relação com Blake, mas não consegue resistir ao seu charme. E assim, aos poucos, vai descobrindo mais sobre os casamentos que não deram certo e o filho que ele não vê há mais de 20 anos. Ao mesmo tempo, Blake recebe o convite para um grande show. O problema é que ele teria de engolir seu orgulho e abrir a apresentação de seu antigo pupilo.
A conversa entre Blake e Tommy é fundamental ao que vem a seguir. Farrell, que estranhamente não aparece nos créditos principais, enruga a testa, faz cara de coitado e passa o tempo todo venerando seu antigo mestre, a quem superou no sucesso, mas não na qualidade das músicas. É esse dom de escrever as canções certas que Tommy precisa para seu próximo disco.
Os dilemas pessoais, a derrota para o álcool, a vida na estrada, enfim, todo o drama é encarnado em cada pelo branco da barba de Jeff Bridges, que prova o tanto que Blake apanhou da vida. Mas agora que ele tem a chance de dar a volta por cima, será que vai dar tempo ou já é tarde demais? Essa falta de confiança é o que separa Bad Blake do Dude, personagem que Bridges interpretou em O Grande Lebowski (1998). E ao interpretar isso tão bem e ainda conseguir manter o carisma para um personagem tão desgastado ele traz ao filme um brilho próprio, mais forte que os holofotes que iluminam cada um dos belos números musicais. Some isso ao apaixonante charme de Maggie Gyllenhaal e você certamente entenderá porque o filme vai continuar ecoando em sua mente tão forte quanto a música sai do violão de Bad Blake.
De Marcelo Forlani da Omelete.com
Nota: 8,5
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