WATCHMEN POR IBERTSON MEDEIROS
Finalmente conferi a tão comentada e aguardada adaptação da mais reverenciada graphic novel de todos os tempos: Watchmen. Criada por Alan Moore e ilustrada por Dave Gibbons entre 1986 e 1987, com doze volumes e publicada pela DC Comics, seu surgimento foi um marco não só para as histórias em quadrinhos, mas para a literatura em geral, sendo incluída em rankings mundo afora como leitura indispensável. Passando por mãos de diversos roteiristas e diretores, dentre estes Terry Gilliam, o filme acabou ficando no comando de um diretor incomum para conduzir uma obra de tamanha dificuldade para adaptar: O "visionário" (Palavra muito mais adequada para o já citado Gilliam) Zack Snyder, anteriormente um video-clipeiro, como a maioria dos cineastas estreantes ultimamente, principalmente se levar em consideração o comando de um remake de um filme famoso de terror, no caso de Snyder, seu debut Madrugada dos Mortos, uma refilmagem do clássico Despertar dos Mortos, de George Romero. Seu segundo filme foi a adaptação de outra graphic novel, Os 300 de Esparta, criada por Frank Miller. Tendo um sucesso bastante considerável, tanto de crítica quanto de público, chegara a chance do diretor mostrar serviço com a adaptação da obra-mor de Moore e felizmente conseguiu um resultado surpreendente.Apesar de Snyder não ser um diretor nada autoral, já que apenas fez adaptações de trabalhos já existentes, ou seja, um remake e duas transposições de HQs para o cinema, conseguiu mais respeito ainda, por não transformar uma obra de Moore em um lixo, como acontecera com A Liga Extraordinária e no regular Do Inferno. Melhor: Teve êxito em transformar Watchmen em um filme bem acima da média, com um roteiro muito bem escrito por David Hayter (X-Men e X-Men 2) e Alex Tse. Não cheguei a ler a obra de Moore, mas mesmo sem saber quase nada da história da HQ, me senti surpreendido com o trabalho maduro de Snyder, digno de aplausos, apesar de ainda conter poucos erros.Dito por muitos como sendo infilmável, devido a diversos aspectos que não ficariam bem se transpostos para a telona, como metalinguagens utilizando quadrinhos dentro de quadrinhos, por exemplo, o diretor manteve-se altamente fiel aos cenários e personagens da história, modificando-se mais acentuadamente o final, transformando em algo mais realista. A trama se passa no ano de 1985, em uma realidade paralela, onde os Estados Unidos tem como presidente Richard Nixon, em seu quinto mandato. Com a ajuda dos chamados heróis mascarados e com o poder imenso de Dr. Manhattan (Billy Crudup), único com poderes sobrenaturais, os americanos conseguem sair vitoriosos da Guerra do Vietnã. Há, no entanto, a possibilidade de ocorrer uma guerra nuclear entre EUA e Rússia, uma acentuação da Guerra Fria. Com a criação da Lei Keene, devido a diversas reclamações da sociedade, porque os vigilantes estavam agindo acima da lei (Onde surge o famoso brocardo latino utilizado por Alan Moore,"Who watches the Watchmen?"), obriga-se os heróis a se aposentarem.Após o assassinato misterioso de um dos vigilantes, conhecido por Comediante (Jeffrey Dean Morgan), Rorschach (Jackie Earle Haley), outro membro da última leva de heróis mascarados, começa a investigar a fim de saber a absoluta verdade. Outros integrantes, como Ozymandias (Matthew Goode), dito como o homem mais inteligente do mundo, transformou-se em um bem sucedido homem de negócios. Dan Dreiberg ou Coruja (Patrick Wilson) leva uma vida pacífica, assim como o poderoso Dr. Manhattan e sua namorada Laurie Jupiter ou Espectral (Malin Akerman). Aos poucos, Rorschach vai descobrindo um padrão entre as pistas deixadas pelo misterioso assassino e faz com que os heróis voltem a agir.Os créditos iniciais do filme são brilhantes, contando rapidamente o destino dos antigos mascarados Minutemen e o surgimento dos Watchmen, ao som de "The Times they are A-Changin", de Bob Dylan. Aliás, a utilização da trilha sonora é bem interessante, apesar de nem sempre bem encaixada em cena, indo desde Unforgettable, de Nat King Cole, até The Sound of Silence de Simon & Garfunkel, na cena do assassinato do Comediante e em seu funeral, respectivamente. Outro fator interessante no filme é que não se trata de um filme pipoca, típico da maioria dos filmes de heróis. Portanto, não espere sequências de ação mirabolantes a toda hora e explosões, apesar de também possuir tais cenas, mas em número reduzido. E falando em ação, são aquelas dignas do próprio diretor, em câmera lenta e não são tão boas, destacando-se duas ou três. O trunfo do filme vai mesmo para sua história e para os personagens, todos muitíssimo interessantes, além de visualmente fantástico.O maior destaque, na minha opinião, é Rorschach, interpretado com inspiração pelo talentoso Jackie Earle Haley, indicado ao Oscar por seu papel em Pecados Íntimos. Toda a violência e anarquia mostradas pelo seu personagem são justificadas, através de flashbacks, transformando-o em algo ainda mais assustador. Por falar no filme dirigido por Todd Field, também está no elenco Patrick Wilson, no papel do Coruja, estando apenas correto, juntamente com a sueca Malin Akerman.
Outro destaque vai para Jeffrey Dean Morgan (Um misto de Javier Bardem com Robert Downey Jr. na aparência), como o Comediante, um personagem forte, violento e complexo, aparecendo pouco, mas de fundamental importância. Sem contar Dr. Manhattan, outro que é fantástico, interpretado por Billy Crudup, um ser humano transformado em uma criatura poderosíssima através de um experimento, capaz de teletransporte, multiplicação, desintegração de matéria e descarga de grande energia, mas que possui dificuldades de se relacionar com outras pessoas e visivelmente misantropo. O mais fraco no elenco é Matthew Goode, insosso no papel de Ozymandias, onde poderia ser bem melhor.Além disso, Zack Snyder aumentou a dose de violência e sexo, com muitas cenas sangrentas e gráficas, mas não é um aspecto que considero negativo. Pelo contrário: Como se trata de uma obra adulta, não teria margem para o politicamente correto e o diretor está de parabéns. Sua longa duração não é nenhum empecilho, já que nunca fica monótono. Aliás, Zack Snyder promete lançar em DVD a sua versão do diretor, com mais de 3 horas de duração, um motivo para rever o filme posteriormente. E no fim do mês chega ao Brasil Contos do Cargueiro Negro, um curta de animação baseado em uma parte da HQ que ficou de fora do filme, sabiamente. Sem contar Under the Hood, contando alguns detalhes sobre os Minutemen, também contidos na graphic novel.Watchmen é um grande filme, um blockbuster adulto e sombrio, com personagens questionando a existência de Deus, crises existenciais, filosofia, dentre outros assuntos não convencionais nesse gênero cinematográfico. Terceiro filme de Snyder e seu melhor trabalho até então, estando envolvido em meia dúzia de projetos até 2011, como Guardians of Ga'Hoole, Sucker Punch, uma sequência de 300, The Illustrated Man, um dos segmentos de Heavy Metal, juntamente com David Fincher, Gore Verbinski, Kevin Eastman e Tim Miller e Cobalt 60. Como se observa, trabalho não está faltando para o "visionário" e dependendo do carinho dado a Watchmen, podemos esperar ótimos filmes pela frente na mão desse diretor mais do que promissor. Conseguiu fazer com que tenha gostado muito do filme, ter vontade de revê-lo posteriormente e me incentivar a ler os quadrinhos de Alan Moore. Não é qualquer um que consegue isso.
Nota: 9.0